A importância de um ambiente de respeito no cultivo de Mindfulness para mulheres
(Texto escrito para o blog do Centro Brasileiro de Mindful Eating - @centromindfuleating_brasil)
As palavras têm sido minhas parceiras em desvendar emoções, necessidades e missões. Quando pensamos na relação com a comida, elas são essenciais para descrever algo diferente, como a liberdade da tóxica cultura da dieta e a resposta de como seria uma relação com a comida e o corpo que vale a pena ser vivida.
E hoje nesse texto peço ajuda delas para descrever o ambiente de respeito que é essencial quando estamos aprendendo, cultivando ou caso você prefira, treinando Mindfulness.
Todas as pessoas merecem um ambiente de respeito no Mindfulness, e mais especificamente hoje falo com você, mulher.
Todas as mulheres merecem um ambiente de respeito quando estão cultivando Mindfulness e Mindful Eating.
As vezes nos esquecemos disso até que somos lembradas. Um ambiente de respeito envolve uma professora ou professor que reconhece as bases éticas desse trabalho. E que sabe o impacto positivo de estados mentais saudáveis. Respeito significa que o professor através da sua prática pessoal e banhada pela compaixão e sabedoria permite que suas alunas possam dar espaço à vulnerabilidade, abrindo seus corações que muitas vezes estão despedaçados e machucados – citando aqui “o abrir o coração” como o treino das potencialidades do ser. Nesse espaço de respeito é possível curar e desenvolver qualidades mente/coração que são essenciais para vidas significativas. Práticas decisivas para o alívio de sofrimento, mas também para o cultivo da saúde e felicidade.
O que não é normal ou saudável para mulheres é serem caçadas por predadores sexuais e/ou sofrerem assédio e abuso sexual durante esse processo.
Faz parte de uma base ética evitar a má conduta sexual. Isto se aplica ao adultério, mas de maneira geral, ao uso do domínio sexual como uma área para infligir dano – Trecho do livro – As quatro incomensuráveis – práticas para abrir o coração de B. Alan Wallace
Sinto dizer que isso acontece e não só no campo de Mindfulness, mas também no campo da espiritualidade em geral, basta pesquisar as denúncias e notícias sobre professores, gurus e afins.
Como uma professora curiosa de Mindful Eating, perguntei-me como esses ambientes não favoráveis para o cultivo de Mindfulness impactam as mulheres e suas práticas meditativas? Será que esses ambientes seriam um desserviço afastando mulheres ou as deixando em algum nível desconfiadas ou travadas para não se abrirem para práticas genuínas? Deixo aqui um espaço para construirmos as possíveis respostas.
Gostaria de dizer que muitas de nós não sabemos que estamos sendo caçadas enquanto estamos sendo caçadas ou mesmo depois. No entanto, isso inevitavelmente deixa uma marca, e felizmente conforme vamos nos aprofundando na prática da amorosidade, podemos vê-la e cuidar.
Foi o que aconteceu comigo, fui caçada por um predador sexual que deveria ser um professor e construir um ambiente de respeito, na época não me dei conta disso e como resultado consciente sobrou “apenas” uma pesadíssima culpa.
Continuando a história e olhando para traz agradeço, porque de alguma forma depois disso minha sabedoria interna me guiou mesmo sem que eu estivesse consciente. Então me distanciei um pouco dos programas de Mindfulness e mergulhei nos programas de Mindful Eating e por coincidência ou não por muitos anos tive apenas professoras mulheres: Lynn Rossy, Jan Chozen Bays e Char Wilkins, e nesses espaços fui aprendendo o que é um ambiente respeitoso, algo que me permitiu descrevê-lo ali em cima no texto.
Anos depois comecei a me reaproximar de professores do sexo masculino, como alguém que toca algo com muito cuidado e ressabiamento. Comecei a assistir aulas online e aos poucos decidi que era hora de expandir e arrisquei na aproximação fazendo retiros de silêncio. Em um desses retiros, outros instrutores guiavam práticas de bondade amorosa e eu notava sempre um fechamento tão forte que me fazia buscar refúgio fora da sala de meditação. Reconheço aqui um mecanismo de segurança, no qual meu corpo todo respondia e pedia segurança quando um homem que eu não conhecia muito bem guiava uma prática.
Desde o início do retiro eu estava bem atenta para o comportamento do professor mais experiente. Percebia que havia uma preparação do ambiente e ao notar a resposta do meu corpo às práticas conduzidas por ele havia segurança e responsabilidade. Aquele também era um ambiente de respeito assim como criado por minhas professoras.
O interessante é que essa clareza que eu escrevo para você agora não veio enquanto tudo isso estava acontecendo, surgiu aos poucos enquanto abro um cômodo amoroso e sem julgamento para tudo isso.
A boa notícia é que quando relembramos o que merecemos e vivenciamos isso, também aprendemos a questionar e selecionar ambientes mais favoráveis. Assim como no Mindful Eating, ao vivenciar o comer compassivo, relaxamos por experenciar um momento livre das dietas e do julgamento do peso. Depois, é mais fácil procurar lugares semelhantes, assim como se defender daqueles mais desafiadores.
Você, mulher, merece se sentir respeitada e cuidada ao participar de cursos de Mindfulness e Mindful Eating, retiros de formação e retiros de silêncio conduzidos por professores sérios.
Seguem alguns pontos que podem ajudar (baseado na minha experiência):
Assista à palestras e vídeos desse professor e ouça como seu corpo responde a isso, abra espaço para um outro tipo de sabedoria, a intuição. Geralmente podemos perceber algo estranho, como se algo não estivesse “batendo”, mesmo que você não saiba muito bem o que é. Nesse caso, acione a bandeira de precaução;
Aproxime-se e converse com alunas antigas desse professor;
Note como esse professor se comporta na presença de mulheres;
Você pode acionar sua bandeira de precaução se o professor sempre estiver rodeado APENAS de mulheres;
Na minha experiência, em caso de predador sexual, existe um certo encantamento, muitos elogios e centramento da figura do professor, como se estivessem “enfeitiçadas”;
Esteja atenta para conduta sexual imprópria, como flertar com as alunas, elogios, aproximação física de qualquer tipo e/ou outro comportamento que não condiz com as atribuições de um professor;
Caso você tenha se identificado como vítima de um predador e/ou de assédio ou abuso sexual, procure ajuda! Isso importa! Você importa! Coloco alguns canais que podem ser úteis. @brasilmetoo @defemde @justiceirasoficial Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher
Esse texto foi escrito por Driele Quinhoneiro @nutricionistadrielequinho, Diretora e Cofundadora do Centro Brasileiro de Mindful Eating, que já foi caçada por um predador sexual na área de Mindfulness e que quer estar aqui hoje e daqui para frente ajudando mulheres à dizer um basta a condutas sexuais inapropriadas e que sabe que todas as mulheres merecem um lugar de respeito.